Na época do colégio, como todas as meninas, eu também tinha minhas amigas inseparáveis e também éramos as "meninas superpoderosas", que sempre existem em qualquer lugar, em qualquer tempo.
Éramos tão unidas que fazíamos tudo juntas. Estudávamos na mesma escola, na mesma turma, fazíamos parte do mesmo grupo bandeirante, íamos às mesmas festas, mesma praia e trocávamos confidências. Sabíamos de tudo umas das outras. Durante anos a fio foi assim.
Muitas vezes pensávamos no futuro, no nosso futuro como amigas. Tentávamos imaginar o que iria nos separar. O que o futuro nos iria reservar. Não queríamos nos afastar nunca, embora desconfiássemos que isto tinha grandes chances de acontecer.
Pensando nisso, uma noite em que todas foram dormir na minha casa porque no dia seguinte faríamos uma viagem, decidimos fazer alguma coisa concreta em relação ao nosso futuro. Resolvemos marcar um encontro num futuro distante.
Aquele dia eu me lembro perfeitamente: era o dia 4 de setembro de 1972. E por que eu lembro? Porque nós marcamos um encontro para 20 anos depois daquela data. É isso mesmo! Marcamos um encontro para o dia 4 de setembro de 1992. Os 20 anos seguintes passamos lembrando umas às outras deste encontro. É por isso que nunca pude esquecer.
Na verdade, isso foi muito divertido. Uma diversão de 20 anos de duração. Foi divertido planejar o encontro naquela noite e lembrar dele durante duas décadas. Onde iríamos nos encontrar? Que lugar iria resistir sem fechar, ser demolido, falido, transformado em 20 anos? Decidimos pelo aeroporto internacional. Ninguém iria fechar um aeroporto, destruir ou demolir. O aeroporto internacional do Rio de Janeiro não iria mudar de lugar em 20 anos! Foi o que pensamos.
Em seguida, redigimos uma carta com cópia para cada uma de nós onde firmávamos o trato. No dia 4 de setembro de 1992, às 8 horas da noite, nos reuniríamos no restaurante do aeroporto internacional!
Eu, Mírian, Sonny, Tânia, Mary, Ana Cristina, Lúcia e Gelita tratamos de guardar nossas cartas bem guardadas. Mas a cada vez que escrevíamos bilhetinhos umas às outras, por mais bobos que fossem, havia sempre um PS: Não se esqueça do dia 4 de setembro de 1992!
Até pelo menos 1976 nós ríamos às gargalhadas do que poderia acontecer neste encontro. Achávamos que tudo iria ser super diferente daquela nossa realidade. Estaríamos ricas, pobres, gordas, famosas? Estaríamos todas vivas? O que iria acontecer? Imaginávamos também o contrário: talvez não aconteça nada e uma passe na casa da outra de bicicleta para irmos de ônibus ao aeroporto... Como se nada fosse mudar.
Mas a vida é incrível... A partir de 1980 começamos a nos separar, embora não perdêssemos o contato. Nos víamos raramente, mas o dia 4 de setembro de 1992 sempre era lembrado. E assim, aos poucos, cada uma foi se mudando para longe. Sonny foi para os Estados Unidos, Lúcia para a França, Mírian para Salvador... até que sobrou apenas duas de nós no Rio de Janeiro.
O inesperado também aconteceu. O aeroporto internacional - para nós imutável, mudou de lugar! Como isso foi acontecer??? Antes havia apenas o Aeroporto Internacional do Galeão. Pois tiveram a audácia de construir o Aeroporto Tom Jobim para tumultuar nosso encontro! Jamais poderíamos imaginar que um aeroporto fosse mudar de lugar!
Mas enfim, o dia 4 de setembro de 1992 chegou mais rápido do que jamais poderíamos supor. Acredito que a própria ideia do encontro nos manteve unidas. Nunca ficamos sem contato. Entretanto, estávamos fisicamente distantes, em outras cidades, países, impedidas pelo trabalho de nos deslocar. Por isso, o encontro aconteceu por telefone. Todas nós tivemos a sensação de que já havíamos nos divertido o suficiente por conta daquela data. Neste caso, os preparativos foram muito melhores que a festa.