Meu pai costumava ficar entusiasmado com a fartura que temos nos dias de hoje. Ele ficava exultante quando ia fazer compras no supermercado e via as prateleiras cheias de praticamente tudo que se possa querer comprar. Ele ficava feliz em ver as pessoas comprando, enchendo seus carrinhos, as crianças escolhendo seus artigos preferidos, homens e mulheres de todas as idades com suas listinhas de compras na mão.
Eu gostava de ver que para ele não era muito difícil ser feliz. Para quem é do tempo em que só haviam quitandas e armazéns, realmente a visão de um supermercado cheio de provisões é de entusiasmar. Meu pai ia quase todos os dias ao supermercado. Eu também fazia assim para comprar comida fresca e aproveitar as ofertas do dia. Depois, para economizar tempo, passei a ir menos vezes ao supermercado, comprando mais coisas de cada vez.
Todo mundo tem seu supermercado preferido. O mais perto de casa, o que vende mais barato, o que oferece mais conforto ao cliente, o que aceita cartão de crédito, o que fica mais perto do banco, do trabalho, da escola do filho, o que vende determinados itens que os outros não vendem etc. Há muitas razões para a escolha. No meu caso, gosto de ir no supermercado mais próximo de casa e que vende mais barato ou então naquele perto do banco e que tem lanchonetes, pois aproveito para fazer um lanche.
Não é aconselhável fazer compras quando se está com fome pois compramos mais certos itens que não compraríamos se estivéssemos de barriga cheia. Fazer compras com crianças também é difícil. Se a criança é pequena e fica sentadinha dentro do carrinho, ainda temos que prestar atenção para que não coloque a boca na cadeirinha ou a mãozinha nas laterais do carrinho porque outro carrinho pode chegar perto demais e machucar. Mas temos que prestar atenção nas crianças mais crescidas, que já saem andando, porque podem se perder.
Agora lembrei daquele anúncio em que o menino faz a maior cena no supermercado gritando "Eu quero brócolis!!!" Ainda bem que não é muito comum ver as crianças fazendo essas cenas, mas geralmente elas ficam aborrecidas se não comprarmos o que escolheram: iogurtes, chocolates, bolos, balas, doces, brinquedos e mais uma infinidade de itens que possivelmente não constam da lista dos pais.
Minha mãe dizia que ia comprar o "básico", quando se dirigia ao supermercado para comprar feijão, arroz, óleo, açúcar etc, ou seja, quando não ia comprar aqueles itens que as crianças gostam. Lembro que uma vez meu filho ainda pequenininho correu para ver o que havia nas bolsas de supermercado quando chegamos em casa. Minha mãe falou que era só o "básico" (quer dizer: não há nada que você possa querer!) e meu filho respondeu: "Eu quero o "básico"!!!" Muito parecido com o "Eu quero brócolis" do anúncio.
É interessante como os artigos são arrumados dentro de um supermercado. Na frente estão os itens supérfluos e no fundo, mais longe da entrada, os produtos mais essenciais. Junto das caixas estão também os itens que esquecemos com frequência, como pilhas e lâminas de barbear, além de mais supérfluos. O cliente interessado em economizar irá direto ao fundo do supermercado fazer suas compras e depois, se quiser, poderá passear entre as prateleiras dos supérfluos e escolher alguns.
É curioso também observar que os preços nunca têm um valor redondo, ou seja, é muito difícil ver um item que custa R$2,00 ou R$5,00, por exemplo. É sempre R$2,73, R$4,98, etc. Ou então itens concorrentes que brincam com a quantidade e o preço do produto. O item com 400 gramas, o de 900 gramas, o de 380 gramas, 90 gramas etc. Há uma matemática envolvida aí. O cliente poderá facilmente se perder nas contas da regra de três. Por isso as cestinhas de devolução estão sempre com alguns ou muitos itens. Quando o computador começa a somar de verdade os preços das compras, alguns artigos são dispensados.
Mas a organização do supermercado tem uma relação direta com os nossos costumes. O que mais gostamos de comer e beber, o que usamos para limpar a casa etc. Nos Estados Unidos as prateleiras com cereais (flocos de milho) ocupam um corredor inteiro no supermercado, enquanto que feijão e arroz ocupam um pequeno espaço. As embalagens feitas para uma pessoa só consumir são mais facilmente encontradas. Além disso, a gente vê coisas como uma pessoa comprando apenas uma banana. Acho que nunca vi isso aqui no Brasil.
Em determinadas datas os supermercados ficam mais cheios. São os dias de pagamento. Dia 5, dia 10, dia 15, podemos contar que as filas estarão enormes. Geralmente, se estou fazendo "compras grandes", com o carrinho cheio, e há alguém logo atrás de mim com dois ou três itens, eu digo para a pessoa ir na minha frente quando chega a hora de passar pelo caixa. Não custa nada fazer isso, entretanto não gosto quando alguém que não está na fila com apenas um item na mão aparece de repente pedindo para entrar na minha frente na hora de pagar. Acho que ninguém gosta quando isso acontece. As pessoas que estão atrás da gente fazem logo uma cara indignada, na expectativa de saber se vamos concordar ou não em deixar a pessoa passar. O pior é que se deixamos, logo em seguida aparece mais uma pessoa pedindo a mesma coisa! E aí? Vamos deixar um passar mas o outro não?
Nesses dias de mercados cheios de clientes que acabaram de receber seus salários comprando de tudo (achando que têm mais dinheiro neste dia!) não é raro vermos discussões e até brigas nas filas. O motivo da briga muitas vezes é aquela pessoa com o carrinho cheio que distraidamente (ou não!) entra na fila do caixa rápido, para clientes com até 15 itens. Mas existem outros motivos.
Uma vez havia uma mulher na fila do caixa preferencial (aquela dos idosos, gestantes e deficientes físicos) que criou uma enorme confusão no supermercado. Era fácil ver que ela devia ter menos de 65 anos, mas já havia passado da idade para ser uma gestante. Além disso, ela não tinha nenhuma deficiência física. As pessoas na fila começaram a reclamar. Idosos e gestantes, atrás dela, que estava com o carrinho cheio até a boca, estavam visivelmente aborrecidos com a displicência daquela mulher ocupando um lugar na fila "deles". Os mais jovens, da fila ao lado, partiram em defesa dos idosos e falaram com a mulher sobre ela estar na fila errada. Mas faltava pouco para chegar a vez dela, então ela fingiu que não ouviu e não se moveu do lugar. A discussão esquentou. Mais pessoas começaram a reclamar.
Alguém chamou o gerente que, delicadamente, avisou à mulher sobre a questão da fila ser preferencial. Ela não falou nada e continuou no mesmo lugar... A revolta aumentou! De repente, aconteceu o que ninguém esperava! A mulher começou a pegar os artigos que havia comprado e os atirar na multidão enfileirada! Uma bandeja com um bom pedaço de lagarto redondo passou voando perto de mim e se espatifou na prateleira de sucos. Batatas, laranjas, limões e outros itens foram arremessados no povo! A fatia de melancia se despedaçou na perna de um homem! O tomate não sobreviveu! Era uma guerra surreal!
Fui embora antes que a confusão terminasse. Pensei no meu pai que ficava feliz com a abundância do nosso tempo. Tudo é realmente relativo. Existem várias maneiras de se ver uma mesma coisa. Enquanto meu pai ficava feliz, outros se estressam.
19 de outubro de 2009 às 11:08
Oi Leila, obrigada pelo teu comentário lá no Brasil do Bem, seja sempre bem-vinda.
Quanto ao texto do super-mercado, é bom lembrar que em muitos países europeus a sessão para animais domésticos também lota corredores inteiros.
Bjs.
Janeisa